quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Crítica - Chatô - O Rei do Brasil (2015)

TítuloChatô - O Rei do Brasil ("Chatô - O Rei do Brasil", Brasil, 2015)
Diretor: Guilherme Fontes
Atores principais: Marco Ricca, Andréa Beltrão, Paulo Betti, Leandra Leal, Gabriel Braga Nunes, Letícia Sabatella

Apesar dos 20 anos de problemas na produção, Chatô é bom e interessante

Tão importante quanto falar sobre o filme Chatô - O Rei do Brasil é contar sobre a sua complicada história de produção, que já entrou para a história do Cinema Brasileiro.


Chatô - A produção

O ano era 1995. Guilherme Fontes, então com 28 anos, vinha de recentes sucessos na TV e no teatro e era um dos principais galãs das novelas da Globo. Em novembro do mesmo ano ele conseguiria financiamento público de volumosos R$ 12 milhões para realizar o filme Chatô – O Rei do Brasil, baseado no polêmico livro de mesmo nome do escritor Fernando Morais. A previsão era que Chatô fosse lançado em 1997, mas... não saiu. Focado em arrecadar ainda mais dinheiro para tornar seu filme ainda mais grandioso (por exemplo Guilherme tentou trazer o diretor Francis Ford Coppola para ser seu produtor), as filmagens só começaram em 1999. Poucos meses depois viria o grande golpe: graças a uma denúncia de irregularidades na aplicação do dinheiro captado, Chatô seria alvo de investigação judicial.

Chatô – O Rei do Brasil parou. Parte dos patrocinadores - já insatisfeitos com os atrasos - pediam o dinheiro de volta. Dos 12 milhões de Reais prometidos, apenas 8,6 milhões efetivamente vieram. Guilherme Fontes era constantemente criticado pela imprensa e ganhou imagem de ladrão. Mesmo com todos os problemas ele conseguiria patrocínios suficientes para gravar mais cenas em 2002 e 2004. Segundo Guilherme, oitenta por cento do filme estava pronto... mas ainda faltava completar o restante. Sem dinheiro, com problemas e dívidas cada vez maiores, o natural seria entregar Chatô do jeito que estava. Mas não foi o que Fontes fez. Foram mais 11 anos brigando por dinheiro para terminar seu projeto (algumas poucas regravações foram feitas posteriormente com os atores originais já envelhecidos, mas o que faltava mesmo era a pós-produção). E eis que 20 anos depois conseguir o financiamento inicial, para surpresa de todos, Chatô – O Rei do Brasil chegou aos cinemas brasileiros.

Para quem quiser conhecer mais sobre a conturbada história da produção, recomendo a leitura deste artigo da Revista Época. O texto traz uma visão de que todos os problemas que Fontes passou vieram mais da megalomania e irresponsabilidade do ator/diretor do que qualquer desonestidade. Seria isso mesmo? O fato é que Chatô mudou a história do nosso cinema, e depois dele as regras e leis para financiamento de filmes foram bastante alteradas. Por exemplo, hoje o valor máximo de arrecadação depende de quantos filmes e mini-séries o diretor/produtor fez. Sob as regras atuais, o então estreante Guilherme Fontes estaria limitado a apenas R$ 1 milhão se quisesse fazer seu Chatô hoje.


Chatô - A crítica do filme

Chatô – O Rei do Brasil é uma biografia bem humorada e um pouco fantasiosa do empresário Assis Chateaubriand, magnata das comunicações do país dos anos de 1930 a 60, considerado o "Cidadão Kane" brasileiro. O roteiro não é linear, tendo uma edição consideravelmente complexa. No início do filme Chatô entra em coma e, em seu delírio entre a vida e a morte, ele é submetido a um "julgamento" pela sua vida em um programa de auditório estilo Chacrinha. A cada depoimento das "testemunhas", vemos um capítulo da vida do empresário. Vários capítulos seguem uma ordem cronológica, mas nem sempre. E aí conhecemos melhor Chatô: mulherengo, desonesto, chantagista, folclórico e com grande talento político e comercial.

Uma das principais qualidade de Chatô – O Rei do Brasil é seu ritmo. A impressão é que Guilherme Fontes fez de tudo para que seu filme não ficasse chato mesmo percorrendo dezenas de anos da vida do protagonista. E deu certo. Abuso de cenas curtas, diálogos sempre ágeis e bem humorados, o roteiro não linear, tudo é feito para que Chatô seja dinâmico e atual.

Ironicamente, seu dinamismo também trabalha em efeito contrário, gerando os principais problemas de Chatô – O Rei do Brasil: o entendimento dos fatos históricos. Tudo é tão rápido que muitas passagens ficam apenas na "sugestão", sendo confusas ou mal explicadas. O início do filme é especialmente confuso. Por que Chatô está morrendo? O roteiro insinua (erradamente) um acidente de carro. A trombose é real ou fictícia? (e já respondendo, foi real). Para que o filme seja melhor aproveitado, é necessário que o espectador conheça um pouco da biografia de Assis Chateaubriand e de Getúlio Vargas. O que temos na Wikipedia já é suficiente para isto, mesmo se forem lidos apenas pós filme.

Não sei se houve desvio de dinheiro em Chatô. Mas podem ter certeza que enormes quantias foram gastas em figurinos, cenários e locações. A cada 2 ou 3 minutos de filme, roupas, locais, tudo muda. É um verdadeiro desfile. Aliás, o filme é bastante colorido, diria até... carnavalesco.

Chatô – O Rei do Brasil apresenta também várias atuações interessantes. Mais ainda, é como se o filme fosse uma máquina do tempo. Filmado em até 16 anos atrás, muitos atores estavam em evidência na época, mas hoje estão "sumidos" (por exemplo, Andréa Beltrão, que tem uma atuação encantadora); alguns até já faleceram (Walmor Chagas e José Lewgoy).

Com qualidades e defeitos devido seu ritmo acelerado, Chatô – O Rei do Brasil não é um grande filme, mas é bom e interessante. E pelos tantos problemas que teve, é portanto uma vitória de Guilherme Fontes. Aliás, o diretor disse que tinha material suficiente para um filme de 2h20min (foi finalizado em 1h45min). Será que esta versão mais longa corrigiria os problemas de Chatô? Acho que nunca saberemos. Mas o que sabemos hoje é que Chatô – O Rei do Brasil terminou sua longa história de maneira satisfatória. Nota: 6,5.


O ator/diretor/produtor Guilherme Fontes há 20 anos atrás (esq) e hoje (dir)

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